A dor da perda gestacional silencia um projeto de vida especial. Você tem vivenciado o luto desamparado, onde a sensação de fracasso ou incapacidade nublou a clareza da sua mente? Ademais, com a perda a crise se instalou no casal, manifestando-se como distanciamento e culpa projetada?
Compreendo a profundidade desta dor. Desde o ano 2000, este consultório de psicoterapia online tem atuado no acolhimento com profundidade de mulheres e casais que enfrentam o luto perinatal. Na experiência de mais de duas décadas em saúde mental e crises conjugais proporciona uma terapia qualificada da dinâmica que está desestabilizando a relação, pautado pela escuta com presença e pelo foco na resolução do trauma.
Neste artigo, eu abordo a importância de viver o luto e dar significado à perda, passos fundamentais para a elaboração. Meu foco é analisar como a culpa emerge como uma defesa psíquica, e como a falta de diálogo qualificado pode levar à distância emocional ou a comportamentos disfuncionais sérios no casal. O objetivo deste conteúdo é guiar sua reflexão sobre a importância da psicoterapia para que a dor não defina o futuro do seu relacionamento.
O impacto emocional da perda gestacional
Passar por um aborto espontâneo ou perda gestacional é uma experiência que mobiliza corpo e mente. O processo físico, muitas vezes doloroso e repentino, deixa marcas que vão além do biológico. A mulher precisa lidar não apenas com o desconforto físico, mas com o vazio emocional que acompanha a interrupção inesperada da gestação. A sensação de desamparo e a dificuldade de compreender o que aconteceu tornam o luto ainda mais complexo.
Depois da perda, é comum que a energia vital pareça suspensa. As tarefas diárias exigem esforço, e a conexão com o próprio corpo pode se tornar difícil. Em meio a essa fragilidade, o parceiro pode reagir tentando ser “forte” ou minimizar o ocorrido, o que gera desencontros. A ausência de diálogo e acolhimento aprofunda a sensação de solidão, mesmo dentro da relação.
Estudos em psicologia perinatal mostram que o acolhimento terapêutico e a validação emocional reduzem significativamente o risco de luto prolongado e facilitam a recuperação física e emocional após o aborto (Frontiers in Public Health, 2023). Quando o sofrimento é legitimado, o casal encontra caminhos mais saudáveis para elaborar a perda e reconstruir o vínculo.
Frases que apagam a dor e o luto invisível
Após a perda gestacional, o que muitas mulheres escutam não é acolhimento, mas tentativas de consolo que as silenciam. Expressões como “pelo menos foi no início” ou “vocês são jovens, logo virá outro” soam como alívio para quem fala, mas desautorizam o sofrimento de quem vive a perda. Quando o ambiente não reconhece a legitimidade da dor, a mulher se retrai. Aprende, mesmo sem perceber, que sentir demais pode incomodar.
Com o tempo, essa ausência de validação emocional começa a corroer o vínculo conjugal. O parceiro, sem compreender a dimensão do trauma, pode reagir com distanciamento, impaciência ou racionalizações que ferem ainda mais. O casal, então, entra num ciclo de desencontros: enquanto um busca sentido, o outro tenta esquecer. Daí surgem comportamentos disfuncionais. Por exemplo: compulsões, fuga para o trabalho, infidelidade emocional ou até a perda do desejo. Ou seja, formas inconscientes de tentar escapar da dor que não foi nomeada.
Romper esse ciclo requer consciência para olhar o que ficou sem expressão. A psicoterapia pode ser o espaço onde essa dor encontra linguagem e onde o casal redescobre a possibilidade de se escutar. Quando o sofrimento é reconhecido e elaborado com apoio profissional, a culpa perde força e o vínculo ganha novas bases de confiança e afeto. É nesse movimento que o luto começa, de fato, a se transformar.

Quando o luto se transforma em culpa
A perda gestacional costuma aciona pensamentos automáticos com duvidas. “O que eu fiz de errado?” “Será que meu corpo falhou comigo?” Essa insegurança são expressões de desamparo, um mecanismo de defesa tentando lidar com sentimentos de fracasso. O trauma agudo rompe defesas antigas e faz emergir outras inseguranças como o medo de não ser suficiente, de perder a admiração do parceiro, de nunca mais recuperar a confiança no próprio corpo.
Mesmo mulheres que já foram mães se surpreendem em passar pelo aborto. O contraste entre experiências anteriores e a perda atual cria um vazio difícil de nomear. A autoestima se enfraquece, e com ela vem a sensação de que algo íntimo se quebrou. Muitas relatam vergonha de demonstrar dor, receio de parecer frágeis, e tentam compensar com autocobrança ou racionalização. Enquanto isso, o parceiro pode reagir com silêncio, buscando conter a própria impotência. Assim, na prática, aprofunda o distanciamento.
Com o tempo, a culpa começa a tomar forma de vigilância interna: revisar atitudes, buscar erros, punir-se por não ter controlado o incontrolável. Esses movimentos não curam; apenas mantêm a ferida aberta. O casal passa a circular em torno da perda, sem conseguir falar dela. Nesses momentos, o que resta não é falta de amor, mas falta de espaço para o sofrimento existir sem julgamento. Reconhecer a necessidade do autoconhecimento é o primeiro passo para que o diálogo volte a ser possível e o vínculo, pouco a pouco, reencontre um sentido de cuidado.
O casal em crise: dor vivida em desencontros
Quando um filho se vai antes mesmo de nascer, o casal enfrenta uma forma de morte que desafia o entendimento. Falta um ritual de despedida a cumprir, um espaço intimo para a dor existir. Sem esse reconhecimento simbólico, o luto se torna difuso. Dessa forma, algo que pesa, mas que não encontra forma. E é nesse vazio que o vínculo começa a se perder: a intimidade esfria, o toque fica tenso, e o medo de dizer algo errado cria silêncio onde havia troca.
A perda gestacional não processada pode também despertar outras fragilidades já existentes. Muitas mulheres relatam que, após o aborto, sentiram abalos em áreas que pareciam estáveis. Ademais autoconfiança, vida profissional, desejo, sensação de pertencimento. A ausência de elaboração emocional não apenas intensifica a dor, mas pode gerar sintomas depressivos e crises de identidade.
Nesse sentido, um estudo publicado no Journal of Affective Disorders (2022) aponta que mulheres que não recebem apoio emocional adequado após perdas perinatais têm maior risco de desenvolver depressão e isolamento conjugal. Esse dado reforça o quanto a ausência de reconhecimento do luto impacta o casal como sistema emocional.
Para muitos, o primeiro passo de reconstrução começa quando o casal vive a despedida e cria um espaço de memória. Reconhecer o filho que não veio não é permanecer na dor, mas dar a ela um nome. Quando a perda ganha significado, o relacionamento volta a respirar; o amor se reorganiza, mais real e consciente do que antes.
Da dor ao distanciamento: o risco da infidelidade emocional
Quando o luto não é compartilhado, o casal começa a viver em ilhas separadas. Um tenta proteger o outro do sofrimento, mas o silêncio acaba virando muro. A ausência de diálogo cria uma sensação de solidão dentro da relação, e nesse terreno fértil de afastamento surgem os primeiros sinais de fuga emocional. Não é raro que um dos parceiros torne-se emocionalmente vulnerável e busque atenção fora de casa.
A infidelidade emocional, nesse contexto, não nasce de desejo, mas de carência. O parceiro que não consegue acessar o vínculo afetivo dentro da relação pode se apegar a alguém que o ouve. Esse tipo de envolvimento pode começar como desabafo e termina como uma fonte de confusão e sabotagem familiar.
Pesquisas em terapia de casal indicam que crises de infidelidade após traumas emocionais estão associadas a vínculos que perderam a capacidade de partilhar vulnerabilidade. Por isso, o desafio é reabrir o canal de conversa, permitir que ambos falem sobre o que ainda dói e redescubram o contato afetivo dentro da relação. A fidelidade verdadeira nasce dessa presença. Bem como aprender com os erros e fortalecer a consciência pelo autoconhecimento.

Psicoterapia para Luto Gestacional: espaço para Elaborar e Reconstruir
A perda gestacional traz uma pausa na rotina, um silêncio que se instala entre o casal e o mundo. Nessa travessia, a psicoterapia oferece um espaço onde a dor pode existir sem precisar ser explicada ou escondida. Como descreve Irvin Yalom (2008), “a cura se dá quando a dor encontra linguagem e o sofrimento ganha companhia.” Esse é o sentido da terapia: acolher o que está fragmentado.
O trabalho clínico se faz na escuta sensível e na sustentação da experiência emocional. O terapeuta ajuda a distinguir a dor que pertence à perda da culpa que tenta controlá-la. Essa diferenciação é essencial para que o casal possa viver o luto sem se culpar mutuamente ou se afastar. A sessão se torna o lugar onde é possível reencontrar-se.
Com o tempo, o casal começa a reconhecer que o vínculo não se encerra no luto, mas se redefine. Elaborar a perda é dar lugar à falta sem deixar que ela destrua o amor. A psicoterapia conduz a esse ponto de encontro: quando a dor deixa de ser abismo e passa a ser ponte, entre dois que seguem, lado a lado, aprendendo a existir depois do que se perdeu.
Reencontrar o Afeto: Transformando a Dor em Linguagem
Cada casal vive o luto de um modo singular. Alguns percebem logo que o vínculo se alterou e buscam ajuda antes que o afastamento se torne abismo. Outros só percebem quando a convivência já está marcada por irritabilidade, mal-humor constante ou um diálogo passivo-agressivo, em que o amor ainda existe, mas vem coberto por acusações e ressentimentos.
Além disso, há também quem se refugie no silêncio, transformando a dor em indiferença aparente. Nenhuma dessas reações é sinal de fraqueza. Alias são tentativas, ainda desorganizadas, de lidar com o que não se consegue nomear.
Quando os sentimentos não são reconhecidos, o luto encontra saídas confusas: explosões de raiva, cobranças, impaciência ou apatia. A agressividade, muitas vezes, é apenas a face visível de um desamparo que não encontrou palavras. O mal-humor e o distanciamento funcionam como defesas psíquicas contra o medo de desmoronar. No fundo, é a dor tentando sobreviver sem linguagem.
A psicoterapia oferece o espaço onde esse sofrimento pode, enfim, ser traduzido. Como lembra André Green, “a palavra é o corpo do afeto” é por meio dela que o casal recupera o contato com o que sente. Ao aprender a falar sobre o que doeu, sem julgamento nem pressa, a raiva perde força e a ternura reaparece. Reencontrar o afeto, nesse sentido, é devolver humanidade ao vínculo: permitir que a dor se torne diálogo e que o diálogo volte a ser encontro.

Conclusão: Reencontrar-se nas perdas é possível.
Se você chegou até aqui, talvez carregue em silêncio algo que o mundo não costuma ver: o peso da perda, o cansaço de seguir funcionando, o medo de nunca mais se sentir inteira. A perda gestacional é uma ruptura na alma, um amor interrompido.
A psicoterapia individual ou de casal, no formato online, pode ser o primeiro lugar onde essa dor encontra descanso. Um espaço onde você não precisa se justificar, nem ser forte. Aqui, a perda ganha palavra, o corpo volta a ser ouvido e a culpa começa a ceder. É um processo que devolve presença consigo mesma, com quem você ama, com a vida que segue.
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